Descrição
Existem vários teóricos de teatro que embarcam na difícil tarefa de formar um ator, de desvendar a arte de atuar, mas um dos maiores focos deste mistério envolve a “verdade cênica". Quais seriam os princípios comuns da arte de atuar de maneira crível e empolgante? Por que muitos atores não são verídicos em cena?
A partir da nossa experiência de 30 anos como atores, diretores e professores, re visitaremos algumas técnicas já utilizadas no aprendizado do ator, porém propondo um caminho mais eficiente para se chegar numa atuação verdadeira e não apenas decorar o texto e fazer trejeitos, antes que o ator iniciante adquira vícios e caricaturas tão comuns nos palcos. Para isto utilizaremos técnicas que, em princípio improváveis de estarem juntas, mas que na nossa compreensão e experiência, acreditamos que possam provocar resultados diferentes em cena, resultados novos.
Começaremos pelo corpo do ator, já que este é a sua ferramenta (incluindo aqui, a voz como parte do corpo que se expressa); em seguida falaremos do jogo cênico que acontece a partir de uma observação aguçada e, paralelo a tudo isso, trabalharemos a imaginação como fonte para a verdade cênica.
As técnicas de Meisner são o nosso “guarda chuva” maior, a partir disso pretendemos re-explorar a consciência corporal, vocal e o jogo cênico com um novo olhar que auxilia no entendimento do processo “meisneriano” e o potencializa. Exercícios que fazem parte dos ensinamentos dados para atores em diversos cursos, mas que podem ser mais explorados quando o conceito de escuta do Meisner é considerado.
Além de exercícios específicos para estimular um corpo e voz mais maleável, utilizaremos da máscara neutra para abrir novas possibilidades nesse corpo. A máscara nos servirá para deixar o corpo reagir, para exercitar a reação corporal, mas também para auxiliar naquilo que chamamos de observação dinâmica.
Paralelo a máscara teremos a introdução de textos que serão exaustivamente repetidos durante o curso. O aluno então, de tanto repetir, decora o texto e pode agora apenas observar e reagir.
A dinâmica da observação e da imaginação no trabalho do ator são o norte das aulas. Trazemos uma oficina de teatro onde o foco é a arte de observar e estimular a imaginação. Observar o corpo, a voz e o outro, a observação externa e a interna. Como que eu dou, como que eu recebo? Como dar e perceber a recepção do outro?
É uma pesquisa para auxiliar a arte de atuar.
Objetivos
Treinar atores para a verdade cênica a partir da imaginação e de uma observação dinâmica.
Redirecionar corpo e voz; estimular a imaginação; exercitar a observação, a escuta; explorar a máscara neutra e introduzir o método de Meisner.
Justificativa
Por que trabalhar a observação e a imaginação?
“... todo artista verdadeiro, e especialmente os talentosos, tem dentro de si, profundamente enraizado e com frequência inconscientemente, desejo por transformação.” (MICHAEL CHEKHOV).
"Atuar é se comportar verdadeiramente sob circunstâncias imaginárias." (MEISNER)
Geralmente somos ensinados no teatro a fazer uma partitura vocal do texto, gravando esse texto dentro de uma construção intelectualizada das reações que devemos ter. Exatamente por isso, aparece a falta de verdade do ator em cena, se constrói a interpretação de forma intelectualizada e não de forma imaginativa.
Com isso temos, nas atuações habituais, um leque de estereótipos cênicos, exaustivamente explorados, presos em construções intelectuais. Por isso o ator, para ser verdadeiro e potente em sua atuação, deve extrapolar essas caricaturas.
Através da imaginação é possível substituir essas construções estereotipadas, enganando o cérebro e desencadeando emoções e sentimentos que sustentam uma atuação. O cérebro pode ser enganado, já que ele não diferencia o que é real, ele entende que aquilo está acontecendo; basta ter um estímulo imaginário.
Nós somos tudo. Nós somos tudo na imaginação.
Somos atores porque queremos ser um milhão de outras pessoas, queremos viver outros mundos, queremos chegar em outras coisas e para isso é preciso muita imaginação para criar a crença que somos o que apresentamos em cena.
Aliado à imaginação temos a observação.
A verdade cênica não está na troca de palavras, é muito fácil entrar numa construção intelectual se ela for baseada apenas no texto, caindo novamente nas caricaturas cênicas. O ator precisa entrar em cena e ser capaz de observar o “como” esse texto está sendo dito e ser afetado por ele. O ator sempre deve estar preparado para receber algo completamente novo.
Por isso a observação é um dos grandes aliados na formação de atores, mas essa observação não pode ser estática, individual, ela precisa ser dinâmica.
A observação dinâmica vai e volta, mudando, se modificando. Não é algo estático de um para o outro; como a ciência moderna enfatiza, só o fato de estar observando, altera o observado.
Portanto o trabalho do ator deve ser baseado na desconstrução de modelos , auxiliando o iniciante do teatro a se explorar de forma mais ampla a partir de uma imaginação potente e treinada e, uma observação dinâmica de tudo que acontece em cena. Desta forma ele pode deixar que o texto flua conforme o que é mostrado naquele momento pelo seu corpo e pelo corpo que está a sua frente.
“A emoção é uma reação. Há um estímulo interno ou externo e a reação sob forma de comportamento manifesta uma emoção” (BARBA, 1989, p. 55)
"A verdade de nós mesmos é a raiz da nossa atuação" (MEISNER)
Metodologia
A oficina pretende desenvolver algumas habilidades para o exercício de atuar através dos jogos teatrais, e de exercícios com o corpo e a voz como base preparatória dos instrumentos do ator. Em seguida utilizaremos as máscaras brancas como processo intermediário ao Meisner e por último uma introdução ao método Meisner.
Esta oficina é dividida em 3 blocos:
A preparação do corpo do ator:
Para o trabalho corporal, utilizaremos o método desenvolvido por Renata Melo.
Este método se baseia na relação de causa e consequência. O aluno aprende no corpo a responder organicamente a um estímulo dado estando atento ao fluxo. Ele será treinado a trabalhar um impulso em uma parte do corpo e esse impulso gerará um reflexo orgânico, corporificando a resposta verdadeira a um estímulo.
A ligação deste método com Meisner é essa, um impulso é dado por “como” o outro ator fala e deixando isso o afetar, aparece a resposta. No método de Renata essa experiência é aplicada no próprio corpo, não gerando respostas intelectualizadas e não orgânicas.
Além disso, iremos trabalhar para que esse corpo seja flexível e aberto, esteja pronto para a cena e desenvolva novas possibilidades corporais que vão para além daquele ser humano carregado de vivências, ampliando e desconstruindo as respostas corporais.
Paralelo entramos na fala, o segundo instrumento do ator em cena. O trabalho da fala do ator não se finaliza na clareza do que está sendo dito (embora isso deva sempre ser trabalhado com boa dicção e volume), existe um meio neste universo que se chama de “verdade cênica”.
Uma voz deve sempre ser um reflexo daquilo que foi apresentado em cena, porém mesmo que isso aconteça com a ajuda de técnicas vocais, precisa ainda conter a verdade, a vivacidade que tanto procuramos. É preciso aprender onde colocar a voz, pensando no aparelho fonético e incluindo uma resposta verdadeira.
Existem duas bases importantes: a dicção, como eu mastigo as palavras; e a segunda que é a projeção. Para que a resposta seja natural e verdadeira, temos que compreender o aparelho fonético sem esquecer de que ela é consequência de um estímulo e deve chegar na platéia de maneira natural e realista.
Podemos dizer algo baixo, sentimental e verdadeiro e ainda ser ouvido compreendendo onde essa voz reverbera no corpo e reagindo ao que foi dito. Caso contrário, falo verdadeiramente mas não sou ouvida, ou para ser ouvida, estragamos a reação se coloco muita força para ser ouvido, sem saber onde colocar a voz eu afeto a reação.
Após essa fase preparatória do corpo e voz, faremos um passeio pelos jogos teatrais, que auxiliam o ator a experimentar esse novo corpo e voz em cena, mas agora trazendo os dois elementos que são foco nessa pesquisa: a observação dinâmica e a imaginação. Estimulado pelo jogo teatral o ator fica aprende a olhar novamente, e depois reagir ao que está sendo mostrado para ele.
As máscaras neutras:
A utilização da máscara no processo de observação e imaginação terão dois eixos: o autoconhecimento corporal e a escuta (leitura) corporal.
Quando utilizamos a máscara, perdemos o rosto e ganhamos um corpo. O grande ganho da máscara é que seu corpo “tem” que dizer. Ele já diz, todo corpo diz, mas na maioria das vezes ele diz sempre a mesma coisa. Ele já está marcado, viciado, traz apenas algumas informações e nos impossibilita de dizer outras coisas que não sejam aquelas das quais estamos acostumados. Então deve-se exercitar esse corpo para dizer outras coisas. Exercitar o dizer corporal de forma consciente, do jeito que é necessário para uma atuação efetiva. A máscara auxilia exatamente nesse criar um novo “dizer” corporal e imaginativo.
Em primeiro lugar, o ator precisa saber o que seu corpo comunica, reconhecer o próprio corpo, seu funcionamento, seus limites, seu biotipo e, tendo essa consciência, poder ampliar a atuação explorando outras possibilidades. Assim mesmo tendo um corpo franzino ainda pode ser violento, por exemplo…
Paralelo a isso o ator que observa o outro com máscara neutra percebe o quanto aquele corpo fala e terá que preparar seu corpo para reagir a outras linguagens que não são só as palavras que estão sendo ditas. A máscara treina o ator a ler as reações além do que está sendo dito.
Neste momento, juntamos as teorias de Meisner que se baseiam na escuta, não só na escuta verbal, mas também a corporal.
A máscara promove um treino dessa escuta corporal, é um treino para a observação dinâmica. Pretende-se treinar para que o corpo fale sem os estereótipos, sem as teorias, sem o pensar antes; com o óbvio: O que esse corpo está me dizendo!
Quando um ator inicia seu trabalho, muitas vezes é através de um texto, porém quando se aprende antes a ler a gama de leituras corporais através da máscara neutra, temos uma compreensão maior de como o texto está afetando, como o corpo diz esse texto; abrindo mais possibilidades de reações e tornando a atuação mais verdadeira; por que temos mais elementos para reagir.
Ela nos ajuda a entender as técnicas de Meisner mais facilmente, pois tem-se um corpo grande, que fala. Assim, fazemos uma leitura mais real das reações que o texto produz, já não é só a voz e o rosto atuando, é um corpo inteiro falando e reagindo ao texto falado.
Buscamos aguçar essa observação de linguagens para além do texto a ser dito, estimulando no processo da imaginação como fonte da arte de atuar.
Introdução ao método Meisner:
Introduzindo as propostas de Meisner após a utilização da máscara neutra, o ator já possuirá treino na arte da observação, uma observação muito mais efetiva; e na arte da imaginação. Com isso, nos famosos exercícios de repetição que Meisner propõe, teremos um ganho na qualidade dessa repetição, pois o ator tem mais ferramentas e elementos adquiridos nas suas explorações da máscara.
O método de Meisner não é muito divulgado no cenário artístico em nosso país, talvez por isso encontramos tantas atuações caricaturais nos nossos palcos. Ele foi desenvolvido por Sanford Meisner, um professor, ator e diretor americano que foi um dos fundadores do The Group Theatre.
A série de exercícios propostos trabalham a habilidade de improvisar e trazer espontaneidade para atores e atrizes vivendo verdadeiramente situações imaginárias em cena.
“A base da atuação é a realidade do fazer.” (MEISNER)
Meisner acreditava fortemente que fazer realmente seria sempre mais eficaz para o ator, do que fingir fazer.
“O que você faz não depende de você; depende do outro sujeito.”(MEISNER)
O método coloca o foco em estímulos externos (principalmente o outro ator) e responde em proporção direta ao que você recebe.
Público Alvo
Jovens atores iniciantes a partir de 18 anos.
Plano de trabalho
2 aulas por semana com a duração de 3 horas, cada aula por 3 meses consecutivos, totalizando 16 aulas.